Infertilidade: quando o sonho de ter filhos exige apoio emocional e planejamento Por CLAYTON BURGATH Postado em 19 de setembro de 2025 0 Psicóloga perinatal explica impacto psicológico, social e conjugal da dificuldade de engravidar e orienta casais a buscar rede de acolhimento e terapia Reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como uma condição de saúde, a infertilidade atinge cerca de 17,5% da população mundial — ou uma em cada seis pessoas. Para a psicóloga perinatal Thalita Laguna, autora do livro Muito Além do Positivo – A Realidade por Trás da Jornada de Tentar Engravidar, a descoberta da dificuldade de conceber é um choque que mexe com vários aspectos da vida. “É uma doença que interfere no trabalho, na convivência familiar, nas relações sociais e, principalmente, na identidade. Muitos crescem com o ideal de formar uma família e, de repente, veem esse projeto ameaçado”, afirma. Thalita lembra que, desde a infância, meninos e meninas são incentivados a imaginar o futuro com filhos. “Brincamos de casinha, ouvimos que um dia seremos pais ou mães, mas ninguém nos prepara para a possibilidade de enfrentar a infertilidade”, destaca. Quando o casal decide recorrer à reprodução assistida, é preciso estar emocionalmente preparado e consciente de que não existe garantia imediata. “A medicina reprodutiva é uma grande aliada, mas trabalha com probabilidades. É essencial entrar no processo com os pés no chão, compreendendo que talvez não dê certo na primeira tentativa”, explica. A especialista recomenda que os parceiros mantenham diálogo aberto e estejam muito unidos, já que o tratamento é intenso em todos os níveis: físico, emocional e financeiro. “Se o relacionamento já enfrenta crises, o desgaste pode ser ainda maior. Mesmo casais harmonizados podem sentir a pressão, principalmente em etapas como o coito programado, que transforma a intimidade em uma rotina mecânica”, alerta. Thalita também chama atenção para o chamado “luto invisível”. Cada ciclo menstrual ou tratamento sem sucesso representa uma perda difícil de compartilhar. “É um luto não reconhecido socialmente. Muitos ouvem frases como ‘relaxe’ ou ‘tente de novo’, que acabam invalidando o sofrimento. Isso leva à solidão e à retração emocional”, afirma. Sentimentos de culpa — por não ter tentado antes, por priorizar a carreira ou por não perceber sinais precoces — são comuns e precisam ser acolhidos. “A culpa é uma emoção natural, mas deve ser observada para que não paralise nem fragilize ainda mais.” Diante desse cenário, a psicóloga orienta a criação de uma rede de apoio: amigos e familiares que saibam ouvir sem julgamentos, grupos de acolhimento e, se possível, acompanhamento terapêutico. “A terapia oferece um espaço seguro para lidar com o luto, a ansiedade e a culpa. É fundamental que a pessoa não atravesse esse percurso sozinha”, enfatiza. Para Thalita, informação e cuidado emocional são passos indispensáveis. “A reprodução assistida oferece esperança, mas exige maturidade. O mais importante é entender que a infertilidade não define o valor de ninguém e que, com ajuda adequada, é possível atravessar essa fase com mais serenidade e perspectivas de futuro”, conclui.